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O advento da Lei nº 14.620/2023 e a possibilidade de instituição do regime de afetação em loteamentos

O advento da Lei nº 14.620/2023 e a possibilidade de instituição do regime de afetação em loteamentos

16 nov 2023

João Victor Barros Paiva[1]

Promulgada em 13 de julho de 2023, a Lei Federal nº 14.620/2023[2] trouxe profundas inovações para o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida do Governo Federal, porquanto, alterou, sistematicamente, uma série de regramentos correlatos.

Dentre tais, podemos citar a inclusão do artigo 18-A[3] da Lei Federal nº 6.766/79[4], trazendo a possibilidade da instituição do regime de patrimônio de afetação para loteamentos, tendo em vista que a instituição de tal regime era restrita aos casos de incorporação imobiliária.

Ab initio, é necessário destacar que o advento do patrimônio de afetação se deu justamente após a derrocada do Grupo Encol, quando então o Poder Executivo percebeu o grande risco que incorporações imobiliária representavam aos consumidores adquirentes de imóveis na planta.

Diante desse cenário, foi editada a Lei Federal nº 10.931/2004, na qual instituiu o patrimônio de afetação com a finalidade precípua de garantir segurança jurídica aos adquirentes de imóveis na planta, trazendo ainda, alguns incentivos ao incorporador que opte por tal regime na sua incorporação.

Em síntese, o patrimônio de afetação cria uma massa patrimonial própria do empreendimento em soerguimento, porquanto, não se confunde com os bens do empreendedor.

É necessário mencionar ainda que recentemente, com a promulgação da Lei Federal nº 14.382/2022[5], o rol de aplicação do regime de afetação aumentou, porquanto, prevê a instituição de tal regime quando se estiver diante da atividade de alienação de lotes, quando tais empreendimentos estiverem vinculados à construção de casas isoladas ou geminadas.

Todavia, a Lei Federal nº 14.620/2023, promulgada recentemente, trouxe ainda mais inovações quando falamos acerca do patrimônio de afetação. Com a nova legislação, os loteamentos também poderão se sujeitar ao regime de afetação.

Tal mecanismo permite que o empreendimento tenha administração própria e autônoma, ou seja, não se confunde com a massa patrimonial do loteador e do incorporador, inclusive quando estivermos diante de uma possível situação de insolvência desses atores.

O regime de afetação, agora podendo ser aplicado aos loteamentos, possibilita que, em caso de falência do loteador, os recursos pagos pelos adquirentes não poderão ser afetados por eventual pedido de recuperação judicial ou falência do loteador, conforme se infere da literalidade do art. 18-F da Lei nº 14.620/2023. Vejamos:

Art. 18-F. Os efeitos da decretação da falência ou da insolvência civil do loteador não atingem os patrimônios de afetação constituídos, não integrando a massa concursal o terreno, a obra até então realizada e os demais bens, direitos creditórios, obrigações e encargos objeto do loteamento.

Por sua vez, é necessário destacar que o patrimônio de afetação, por estar vinculado a execução do empreendimento, tem-se que quaisquer rendimentos que porventura vierem a ser auferidos também deverão ser destinados ao empreendimento.

De acordo com o regramento que rege a matéria, a adesão ao regime de afetação poderá ser feito em qualquer momento. Basta que haja averbação do termo firmado pelo loteador na matrícula-mãe do empreendimento a ser erguido.

Todavia, é relevante que se mencione acerca da impossibilidade de revogação do regime de afetação, ou seja, o seu término está adstrito a observância das hipóteses legalmente previstas.

O art. 18-E da Lei Federal nº 14.620/2023 elenca tais possibilidades de extinção do regime de afetação em caso de loteamentos. Vejamos:

Art. 18-E. O patrimônio de afetação extinguir-se-á pela averbação do termo de verificação emitido pelo órgão público competente, pelo registro dos títulos de domínio ou de direito de aquisição em nome dos respectivos adquirentes e, quando for o caso, pela extinção das obrigações do loteador perante eventual instituição financiadora da obra.”

Assim, podemos concluir que, enquanto não houver a conclusão do empreendimento sujeito ao regime de afetação, a separação patrimonial está mantida

Ato contínuo, é relevante citar ainda que embora a Lei Federal nº 10.931/01 tenha previsto benefícios fiscais aos empreendimentos sujeitos ao regime de afetação, tal como o pagamento de alíquota unificada de 4% da receita mensal percebida, verifica-se que o mesmo não ocorreu em relação a Lei Federal nº 14.620/2023, o que pode ser objeto de discussões no âmbito judicial e legislativo.

Por fim, embora a novel legislação tenha fixado algumas particularidades em relação a Lei Federal 10.931/01, nota-se que a possibilidade de instituição do regime de afetação traz uma série de avanços ao setor imobiliário, já que atendem a um antigo pleito dos loteadores, trazendo segurança jurídica não só para os empresários, mas também aos adquirentes de tais imóveis, já que podem contar com um certo grau de certeza na conclusão do empreendimento.

 

[1]. Graduado em Direito pelo Centro Universitário de Goiás – UNIGOIÁS. Especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas – FGV/RJ. Advogado integrante da banca Crosara Advogados.

[2] BRASIL. Lei Federal nº 14.620/2023, de 13 de julho de 2023. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2023/Lei/L14620.htm Acesso em 29 de outubro de 2023.

[3] Art. 18-A. A critério do loteador, o loteamento poderá ser submetido ao regime da afetação, pelo qual o terreno e a infraestrutura, bem como os demais bens e direitos a ele vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do loteador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução do loteamento correspondente e à entrega dos lotes urbanizados aos respectivos adquirentes.

[4] BRASIL. Lei Federal nº 6.766/1979, de 19 de dezembro de 1979. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6766.htm Acesso em 29 de outubro de 2023

[5] BRASIL. Lei Federal nº 14.382/2022, de 27 de junho de 2022. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Lei/L14382.htm Acesso em 29 de outubro de 2023